domingo, 26 de janeiro de 2014

Em risco de ficar sem carta....

Segundo uma notícia veiculada pelo Diário de Notícias a ANSR ( Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária)  terá notificado cerca de 4700 condutores “(…)  para os alertar que, caso cometam mais uma infração grave ou muito grave ao código da estrada, estão sujeitos a ficar sem carta de condução. Estes condutores estão a uma contraordenação de atingir o limite, previsto na lei, que leva a ANSR a "cassar" os títulos de condução.

A cassação do título de condução, nos termos do art.º 148º do Código da Estrada, ocorre quando o condutor/infractor acumula no seu cadastro (RIC)  três contra-ordenações muito graves ou cinco contra-ordenações graves ou um misto de ambas no espaço temporal de 5 ano - a contar de 6 de Julho de 2008 em diante -  sendo então ordenada a cassação a qual tem como efeito a perda do título de condução e ainda a proibição de obter um novo durante 2 anos. 

A cassação da carta de condução vem já do Código da Estrada de 1954 sendo que era um processo que cabia aos tribunais até 2005 e os pressupostos para efectivar a cassação e interditar a obtenção de novo título não se alicerçavam somente no número de contra-ordenações, bem como variava  entre 1 e 5 anos o tempo em que não se podia "tirar" nova carta ou licença, sendo o sistema bem mais justo do que é hoje.

Apesar de a cassação da carta de condução com os pressupostos actuais e a competência cometida ao presidente da ANSR figurarem em lei saída da Assembleia da Republica isto não significa que seja legal. E porquê? Porque se o Tribunal Constitucional aplicar a Constituição só poderá decidir pela inconstitucionalidade material do art.º 148º do Código da Estrada, uma vez que a nossa Lei Fundamental  proíbe determinantemente no art.º 30º, n.º 4 que o cidadão perca direitos, seja qual for a sua natureza, como efeito necessário de uma pena. E o  efeito necessário  da pena neste caso é a perda automática do título de condução.

Por outro lado, a proibição de obter novo título de condução tem uma duração fixa de 2 anos o que igualmente contradiz um dos principais princípios do direito assente no facto de a pena dever ser graduada em função da culpa do infractor. O que acontece aqui é pura e simplesmente aplicar-se sem excepção a mesma pena para todos. E digamos que a gravidade das contra-ordenações, bem como as consequências destas podem ser bem distintas.

Se por um mero acaso somatório receber uma notificação do presidente da ANSR a informar que a sua carta foi cassada saiba que pode recorrer desta decisão para o Tribunal. Ainda que não queira recorrer informe-se se as contra-ordenações praticadas foram “julgadas”, isto é se recebeu as decisões condenatórias pois só as decisões definitivas podem ser consideradas para ordenar a cassação da carta de condução.


Teresa Lume


1 comentário:

  1. Antes de mais, obrigado pelos vários esclarecimentos sobre esta matéria.
    Quanto à seguinte afirmação:
    "informe-se se as contra-ordenações praticadas foram “julgadas""

    ...gostava de perguntar se souber: Isto é (ou tem sido) efetivamente tido em conta no critério da ANSR avançar para a cassação da carta, ou é vulgar não olharem a esta questão?

    Obrigado, Ricardo

    ResponderEliminar